terça-feira, 16 de agosto de 2016

"O Príncipe" de Maquiavel na modernidade "desejante"

Nicolau Maquiavel viveu em Florença entre os séculos XV e XVI. A Itália ainda não era um “país”, mas um território dividido em diversos “países” que guerreavam entre si em busca de fortalecimento, crescimento e poder. 
É neste contexto que surge “O Príncipe”, em 1513. Sendo Maquiavel o primeiro autor a usar a palavra “Estado” para indicar um território independente, mais tarde conceituado por Hobbes. 
Cabe a Maquiavel ser o primeiro a fazer uma análise da ciência política do ponto de vista prático e objetivo. Até então, um líder deveria ser altruísta com atitudes baseadas nos princípios religiosos.




Maquiavel rompe com esse pensamento e aponta para atitudes práticas e realistas para a atual situação, onde pequenos territórios enfraquecidos lutam entre si causando desordem e insegurança para a população. Ele utiliza os verdadeiros princípios humanos, retirando a moral estabelecida pela religião, para que um príncipe, ou seja, um governante consiga agir fortalecendo seu “Estado”, fazendo manutenção de seu poder e assim, proporcionando o bem comum. O que nem sempre é defendido por algumas pessoas, que atribuem a expressão “Os fins justificam os meios” a Maquiavel e acreditam que as instruções de “O Príncipe” eram apenas para a ascensão do poder de um indivíduo. O que não será defendido neste texto! 
Maquiavel cria uma separação entre política e moralidade, o que era absolutamente necessário naquele momento para garantir a segurança da população e manter a estabilidade política dos “Estados” para que eles se fortalecessem. 
“O Príncipe” rompe com a concepção de virtude sustentada por pensamentos religiosos e lhe atribui novas características quando utilizada no âmbito político. Virtude deixa de ser uma força moral baseada na fé e na bondade e passa a ser um conjunto de atitudes próprias para se produzir certos efeitos.
O livro também aponta para o bom uso da fortuna, não no sentido de riqueza, mas no sentido de casualidade, ou seja, tudo aquilo que acontece sem a intenção do governante. Para bom uso da fortuna, segundo Maquiavel, é preciso ser mais audacioso e menos cauteloso, agir de acordo com as necessidades das situações para dominá-las. Para aliar fortuna e virtude, um príncipe precisa tomar decisões muitas vezes moralmente questionáveis, entre elas, destaco:

Saber a hora de fazer uso ou não da benevolência segundo a necessidade
Caso seja necessário cometer crueldades, o governante precisa cometê-las de uma só vez, já que o povo tem memória fraca e logo se esquece do acontecido. Ainda mais se o príncipe souber manipular as coisas boas, fazendo-as aos poucos para que sempre seja lembrado por sua bondade.

Entre ser amado ou temido, preferir ser temido
Seria muito bom se o príncipe fosse sempre amado por todos, mas isso não é possível porque “o amor é um vínculo de obrigação que os homens rompem na primeira oportunidade.” Diferentemente do temor, que é bem alimentado pelo medo do castigo. 

Ser temido, mas não odiado
Para evitar o ódio, é preferível matar que tirar o patrimônio dos súditos. 

Não utilizar armas mercenárias ou auxiliares
Ou seja, ter um exército próprio que lute pelo “Estado” por fidelidade.

Como utilizar recursos
Se utilizar recursos próprios ou dos súditos, poupá-los. Mas se na marcha com o exército manter-se de roubos, saques e resgates, agir com liberalidade. “...porque gastar aquilo que é dos outros não tolhe ao príncipe reputação, mas acrescenta-lhe; apenas prejudica gastar o que é dele próprio.”

Saber a hora de agir como homem ou como animal
Ou seja, saber a hora de cumprir leis e acordos e a hora de violá-los para não ser enfraquecido. Quando for animal saber a hora de ser leão (forte e impulsivo) e ser raposa (esperto).

Parecer ser
As decisões de um príncipe não podem ser tomadas de acordo com piedade, fidelidade, caridade e religião, mas ele precisa parecer ser piedoso, fiel, humano, íntegro e religioso, porque os homens veem aquilo que o príncipe aparenta ser, não sentem aquilo que ele realmente é. 

Apesar das orientações duras e destituídas de qualquer moralidade, o autor ainda nos diz: 

“... havendo grande distância entre como se vive e como se deveria viver, aquele que deixa aquilo que faz por aquilo que deva fazer, conhece a ruína em vez da preservação.” 

O que nos alerta para o fato de que para seguir tais orientações um príncipe precisa ter muita certeza do que quer e de onde se pretende chegar, assim, não será destruído por suas atitudes.
Percebemos que apesar de ser escrito há cerca de 500 anos, “O Príncipe” é absolutamente atual. Todos os nossos mecanismos de liderança sejam políticos, empresariais, educacionais... enveredam-se pelos ensinamentos de Maquiavel na esperança de ter sucesso na manipulação do poder. Líderes de todos os setores agem seguindo uma forma de governo arcaica que não se encaixa em nossa modernidade, causando um choque de consciências e de gerações que não sabem dialogar. É o conservadorismo espancando a rebeldia ou sendo espancado por ela. Isso porque quando Maquiavel fez “O Príncipe” era realmente necessário buscar a centralização do poder político e hoje isso não é mais possível.
Em uma sociedade cada vez mais consumista, o homem tem colocado seu instinto desejante na frente de tudo. Todos querem alguma coisa o tempo todo e a forma de alcançar seus objetivos materiais é através do poder! A modernidade é orquestrada pela globalização. Informações circulam a todo o momento gerando conhecimento resultando na obtenção do poder.
Quando Maquiavel disse que o homem só não quer ser oprimido, era realmente só isso que o homem queria. Hoje nós queremos muito mais! Queremos mudar o mundo, ter voz, sermos aceitos e senhores da nossa história.
Governos, empresas e escolas continuam caminhando segundo as regras de Maquiavel cometendo violências contra consciências que se desenvolveram em outro contexto. As pessoas têm se tornado cada vez mais vazias e dependentes de ferramentas alienantes, enquanto continuam sustentando discursos revolucionários. São os conflitos entre querer e dever, entre ser e ter, pensar e obedecer. Choques que estão gerando instabilidade política, econômica e social, porque existe um cabo de guerra simbólico entre liderança e indivíduo que só poderá ser superado quando entendermos que hoje não podemos mais nos render ao adestramento, porque todos nós somos seres políticos. 


6 comentários:

  1. Uau. Incrível o post Pit. Parabéns. Maquiavel é Maquiavel. Ainda não li a fundo o livro, mas sempre leio trechos e já estudei um pouco sobre ele. Beijos

    http://lereaminhavida.blogspot.com.br/

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    1. Hey, Gisele! Que bom que gostou! Essa leitura foi tensa, mas consegui sobreviver, né? rsrsrs Beijos e obrigada pela visita!

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  2. Muito bom o seu post. Você levantou alguns pontos bastante relevantes. Li Maquiavel no ensino médio, e não foi uma leitura fácil, pois o livro tem suas complexidade. Um abraço e bons estudos filosóficos.

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    1. Pois é, Marina! O livro traz aquela onda de pessimismo que parece impossível ultrapassar! É difícil seguir em frente, mas vou superar! rsrsrs Obrigada pela visita! Beijos!!!

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  3. Gostei do post !! Nunca li mais fiquei com vontade, acho que vou procurar rsrsrsr. Parabéns
    Beijos !

    https://pequenosinfinitosz.blogspot.com.br/#uds-search-results

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